Torre de Menagem do Castelo de Vila Viçosa, exterior à muralha, Antes da intervenção do Engenheiro Duarte Pacheco, Foto de 1942, in SIPA(editada) |
Localizado na freguesia de Nossa Senhora da Conceição, a mesma onde foi edificada uma Igreja em sua honra, a imagem foi oferecida por D. Nuno Alves Pereira em 1385, após a vitória portuguesa contra os Castelhanos em Aljubarrota, viria a ser proclamada Padroeira de Portugal, por D. João IV em 1646, a partir de então, não mais os monarcas portuguesas da Dinastia de Bragança voltaram a colocar a coroa real na cabeça.
Imagem da Nossa Senhora da Conceição, Procissão saída do Castelo de Vila Viçosa, Publicada por Dnevnik Najedine, Foto da década de 1950(editada). |
Hoje na denominada União de Freguesias de freguesia de Nossa Senhora da Conceição e São Bartolomeu no concelho de Vila Viçosa, próximo à vertente nordeste da Serra de Ossa, ergue-se o Castelo Medieval, um exemplar de arquitetura militar, nos estilos gótico, quinhentista e seiscentista, de enquadramento urbano, isolado, coroado numa colina em posição dominante sobre a vila, defendida naturalmente pela Ribeira de Ficalho e pela ribeira do Carrascal, afluentes do rio Guadiana.
Torriões circulares da Porta de Évora, Ao fundo a as novas ameias da Torre de Menagem, Foto da DGEMN, 1974 (editada) |
Na reconquista cristão de alcácer do Sal, a região passa para os domínios de Sancho II, em 1270 recebe pelas mãos de Afonso III a primeira carta de foral, com esta deixa de ser denominada "Vale Viçoso" e passa a "Vila Viçosa", apesar de ter ascendido concelho alguns anos antes.
Gravura, Alain Manesson Mallet (1630–1706), "Les Travaux de Mars ou l'Art de la Guerre", Data 1696. Acervo: Peace Palace Library. |
O Castelo de Vila Viçosa como o vemos hoje é o produto de três núcleos sobrepostos e de épocas diferentes.
O Castelo e Muradas de Vila Viçosa, Postal n.º 7, Muralhas de D. Dinis, Edição Passaporte Loty, Data 1952. |
Castelo e a Cerca Medieval de Vila Viçosa, foram mandados construir por D. Afonso III e concluído por D. Dinis ainda no século XIII. Por volta de 1290 estima-se que estivesse concluída a cerca da vila, rasgadas por três portas, a do Sol, a de Estremoz e a de Évora, franqueadas por cubelos, que harmonicamente às definiam.
Porta da Cerca exterior do Castelo Foto de 2010, in guiadacidade.pt |
Já pela mão de D. Fernando I, em finais do século XIV, a exemplo do que fez em outros castelos, procedeu a importantes melhorias na fortificação e mandou abrir a sudoeste da cerca a Porta da Torre. No contexto da 3.º Guerra Fernandina, Vila Viçosa tornou-se o quartel-general das operações.
Gravura alusiva ao agradecimento de Nuno Álvares Pereira a Nossa Senhora da Conceição pela vitória sobre Castela, Autor e data não identificados. |
No reinado de D. João I, os domínios de Vila Viçosa são doados ao Condestável do Reino, D. Nuno Álvares Pereira, em recompensa pelos serviços prestados na guerra castelhana, da qual em 1400, resulta o reconhecimento por Castela de D. João I como rei de Portugal. Vila Viçosa fica intimamente ligada a família Bragança, antes mesmo de esta ser a família Real em Portugal, quando era "apenas" a casa nobre mais poderosa do país.
Foral de D. Manuel I, Coordenação, Introdução e Notas, Manuel Inácio Pestana, 1993. |
No início do século XVI, pelas mãos de D. Manuel I, Vila Viçosa recebe novo foral e entre 1515 e 1520 e por iniciativa de Jaime de Bragança inicia-se a construção de uma nova cerca no exterior da vila, envolvendo a antiga e incorporando o Novo Paço Ducal e os principais mosteiros, como consequência demoliram-se casas no interior da muralha medieval, parte do castelo e da cerca velha entre as portas de Évora e as do Sol.
Fortificação do Castelo de Vila Viçosa visto de Noroeste, No interior os edifício mais recentes onde funcionam os museus, Foto da DGEMN, 1974 (editada) |
Entre 1525 e 1537, a construção cujo progeto atribuído a Diogo ou Francisco de Arruda, com algumas reservas uma vez que existem autores que defende que o projeto possa ter sido da autoria direta de arquitetos italianos, que na sequência do reinado de D. Filipe I, abundavam na Península Ibérica, certo é que o castelo foi transformado numa fortaleza de artilharia preparada para os desafios pirobalistica, as novas estruturas são pensadas de forma a dar resposta ao movimento das novas artilharias. De gosto e influência italianos, semelhante a uma planta de Leonardo da Vince, parecido com um castelo norueguês mandado construir por um bispo que vivei em Itália e ainda partilha algumas semelhanças com o castelo de Évora Monte, que terá sido projetado pelo mesmo arquiteto e com as mesmas influencias.
Planta de Vila Viçosa, 1 de janeiro de 1763, Situation des stadt und fortificacion der citadel von Villa Viçosa, Fonte. Centro de Informação Geoespacial do Exercito |
O castelo fortificado, que se encontra dentro da cerca medieval da vila, apresenta uma planta quadrangular, dotada de dois potentes torreões semi-circulares em ângulos opostos. Isolado por um fosso seco, apresenta muralhas compactas e levemente inclinadas, coroadas por um parapeito corrido e rasgado por canhoeiras de vãos generosos. Desta forma, a sua silhueta afasta-se claramente dos castelos de tradição medieval, aproximando-se do perfil das fortificações modernas.
Potra do Cerco do Castelo de Vila Viçosa, Foto de 2018, In vortexmag.net |
No contexto da Dinastia Filipina (1580-1640) Vila Viçosa era sede da maior corte ducal da península Ibérica.
Porta do Cerco do Castelo de Vila Viçosa, Foto de Tiago Passão Salgueiro, 2015 |
Na Guerra da Restauração em 1640, João II de Bragança é encorajado por um grupo de conspiradores a aceitar o trono de Portugal, inicia-se assim a Dinastia dos Bragança com Ascenção ao trono de D. João IV e a definitiva independência de portugal. Ironicamente é aprtir dessa data que Vila Viçosa perde protagonismo com a inevitável transferência da família para o paço da Ribeira em Lisboa.
Fortificação do Castelo de Vila Viçosa visto de Este, Aspeto anterior as obras realizadas na década de 1940, Foto da DGEMN, 1942 (editada) |
Na sequência da guerra que conduziu à definitiva independência de Portugal, o castelo e as muralhas da vila, foram objecto de uma grande reforma repartida por duas fases, ambas resultantes dos projetos do arquitecto francês Vauban: a primeira iniciou-se em 1643 e foi comandada por Pascásio Cosmander; a segunda é o produto da acção do conde de Schomberg, na década de 60. Derradeira intervenção no perímetro muralhado, esta última etapa contou com a construção de revelins e fortins que envolvem a estrutura medieval e também parte da cidade baixa, numa perspectiva defensiva bem diferente e abrangente da que animou as duas anteriores fases de definição deste conjunto militar, viria a ser crucial para repelir o assalto das tropas espanholas em 1665.
No contexto da Guerra da Sucessão Espanhola, um levantamento pelo Estado dos Instrumentos Militares em 1762, indicava graves falhas na estrutura das muralhas que permitiam o acesso facilitado, muro antigo da porta dos Remédios, os postos e trilhos das rondas derrubados, a trincheira à volta da vila estava derrubada salvavam-se as quatro portas da vila que acresciam de poucos conserto e estavam capazes de servir, talvez porque os acesso eram em parte efetuados pelas muralhas derrubadas.
As célebres demolições para aproveitamento dos matérias para novas construções não era comportamento da exclusividade dos civis, neste caso em 1777 a Casa de Bragança mandou demolir o troço da cerca nova no rossio de São Paulo, para ampliação do Paço Ducal.
Porta principal do Castelo Artilheiro, Forte do Castelo de Vila Viçosa, Foto de 2006, in SIPA(editada) |
Ainda no século XVIII procedeu-se a substituição da ponte levadiça da porta principal por uma de alvenaria, sobre abóbada. Distingue-se também o facto de este castelo ser o único em Portugal
que conserva ainda uma porta de entrada principal com passadiço que assegurava a passagem da artilharia e cavalaria e de portilho para peões, que apresenta ainda uma ponte levadiça de madeira com um mecanismo de ferro enferrujado, sobre o fosso.
O Castelo e Muradas de Vila Viçosa, Postal n.º 35, Vista parcial e Paço Ducal ao fundo, Edição Passaporte Loty, Data 1952. |
Na sequência da Guerra Peninsular, face a vulnerabilidade do castelo, este foi saqueado por várias vezes, obrigando a casa de Bragança a efetuar obras de concertos e melhorias, que acabariam por acontecer entre 1821 e 1827.
O Castelo e Muradas de Vila Viçosa, Postal n.º 34, Muralha de D. Dinis, Porta de Olivença, Edição Passaporte Loty, Data 1952. |
Depois de quase trinta anos nas mãos do Regimento da Cavalaria,em 1852 o castelo retornou às mãos da Casa de Bragança que perante tentativas de assaltos policiou o castelo durante vários anos.
O Castelo e Muradas de Vila Viçosa, Postal n.º 27, Um Aspeto Exteriro do Castelo, Edição Passaporte Loty, Data 1952. |
Em 1868, a casa da guarda da Porta de São Sebastião da cerca nova foi demolida para abertura da estrada municipal de São Romão, em 1885 procedeu-se a substituição da ponte de acesso à Porta de Armas por outra, de alvenaria no ano seguinte a construção do cemitério junto à Igreja Matriz sacrificou a Porta de Elvas.
Vila Viçosa, vista aérea sobre o Castelo Artilheiro, Francisco Piqueiro / Foto Engenho 2007, in SIPA. |
Hoje, na área envolvente ao castelo encontramos algumas ruínas, arcos isolados e escadas sem destino, no interior da muralha, conserva-se grande parte da antiga vila, com ruas retilíneas que se cruzam ortogonalmente, erguendo-se sensivelmente no cruzamento dos dois eixos principais, a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, separando-se da cerca virada a Noroeste.
Mesmo aos pés do torreão, a Sudoeste da fortificação, onde foi interrompida a cerca da vila, fica a Porta de Évora, a porta principal, interceta um eixo que coincide com a disposição da Praça do Município, um pouco mais à esquerda junto da cerca, mas do lado de fora, encontramos a torre de menagem que se faz acompanhar pelo Pelourinho, no lado oposto, dentro da cerca mantém-se o cemitério, onde podemos encontra o túmulo da uma célebre escritora portuguesa, Florbela Espanca.
Foto das obras de requalificação e reconstrução das muralhas Entre o torreão da Porta de Évora e a Fortaleza, Foto da DGEMN, 1933 (editada) |
A par do que aconteceu com a reabilitação, na sequência das classificações de monumentos, em meados do século 20 foram introduzidas obras de restauro, que visaram a reintegração das caraterísticas medievais do castelo e de grande parte da estrela. O Projeto de a cargo do Engenheiro Duarte Pacheco levou ao descongestionamento da cerca velha e à demolição de grande parte do sistema tenalhado para a construção da avenida e arranjo urbanístico.
Classificado como Monumento Nacional desde 1910, é propriedade da Fundação da Casa de Bragança, nele funcionam o Museu da Caça e o Museu de Arqueologia da Fundação conserva também no seu interior a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição.
Vila Viçosa candidatou-se em 2018 a aprovação de Património Mundial da UNESCO, candidatura estará em aprovação até 2020.
A Lenda da Bruxa do Castelo de Vila Viçosa;
Nos finais do século XIX, existiu uma velha, Maria Gertrudes, criada de recados, que a mandado da sua senhora percorria as ruas vielas da vila sobre insultos da da população.
Consta-se que esta fora vista já noite a dentro, nas ameias do castelo, agitando um candeia acesa, sobre a antiga porta de Elvas, mesmo junto do cemitério, voltada para Espanha.
"O Turno da Noite" Foto editada |
Quando surpreendida por tais propósitos, naquela noite fria e escura, a velha que trajava uma tecida negra, com um pequeno xaile na cabeça, aberto sobre os ombros e uma cruz no peito, desculpou-se dizendo que procurava por uma tesoura que havia perdido nessa mesma tarde.
A história não convenceu a população que rapidamente associou o estranho comportamento a relações com o demónio, acusando-a de más crenças e da prática de bruxarias.
Não dispensada dos seus afazeres, a velha de olhos pesados e tristes marcados por uma face enrugada e envelhecida, arrastando as chancas pelo mercado perante os olhares e comentários pautados pela falta de discrição propositada, Maria Gertrudes continuou nos seus afazeres, limitando-se a uma mudez confrangida perante as acusações e insinuações de que era alvo.
Refugiada nas suas lembranças de mocoila, do homem que desposou, do nascimento do seu filho, das lembranças das casa fidalgas onde servira, do Tomé de Sousa, dos Machados ou dos Matos Azambuja, das recordações dos arraiais dos Capuchos e do S. Mateus e das modas que cantava por esse tempo.
O Filho Manuel Pardais, passou a ser a sua única preocupação, não sendo desta a sua origem mas de franca aplicação, já diz o ditado "Rebeubéu, pardais ao ninho" denota bem a importância atribuída aos comentários e interpelações de que esta era alvo pela população.
Morava numa pequena casa na Corredoura, não passava bem e uma vezes pior, entretinha a fome com uma côdea e duas negrilhas tiradas da tarefa, às quais juntava a humilhação das acusações que enfrentava quando saia a rua.
- Bruxa! Pobre de mim que não sei o que isso é! – dizia para com os seus botões.
Pobre mulher metida nos seus afazeres, levava a vida a trabalhar na ânsia de ganhar as sopas, reclinada e submetida a tais humilhações receosa de que algo pior pudesse advir.
Quadro "Cabeça de uma camponesa com laço de renda esverdeada" Vincent Van Gogh 1885 |
Conhecedora dos sacrifícios da lavoura nesta terra de mármore e de olivais, homens ganhavam a vida com a foice ou a gadanha nas mãos, tratando das mondas, da cortiça e de alampio.
Num tempo em que a miséria prevalecia, deitava contas á vida e lembrava-se das histórias das feitorias alcançadas no contrabando da raia. Mercadorias clandestinas que trouxeram para alguns proventos certos e fortunas consideráveis.
Quadro "Mulher arrancando batatas" Vincent Van Gogh 1885 |
O Contrabando ganhava força junto das povoações fronteiriças que embora, conhecedoras das punições das transgressões, viviam com a ideia de abandonar a miséria e proporcionar à família uma dignidade que nunca ambicionara para si. A miséria despoletava um vai e vem fronteiriço, que os mais destemidos disputavam, indiferentes ao perigo, verdadeiros heróis desse tempo, arriscavam nas aventuras, para fugirem às balas certeiras das autoridades.
O Filho de Maria Gertrudes, Manuel de Pardais, depois de constituir família , havia side empurrado para o contrabando, pretendia fazer fortuna, trazendo trazendo coisas de Espanha que se destinavam à vila e que fazia nela entrar durante a noite o seu bom nome associado ao pai, afastava dele qualquer suspeita.
Viviam em paredes meias com as suas, dois grudas fiscais, sentinelas vigilantes da fronteira com Espanha, que assim como a restante povoação, só paravam para reparar na velha mulher apenas para lhe fazer figas destinadas a afugentar o mau-olhado e excomungar o mal de que dai pudesse resultar. Ninguém ia ao verdadeiro fundamento de que tais rituais se devessem afinal a uma sinalização combinada com o filho contrabandista, de livre transito após a recolha ou mudança de turnos do guardas fiscais, que configuram grande oportunidade do seu regresso com a mercadoria, sem ser notado pela fiscalidade.
Quadro "Cabeça de um homem", Vincent Van Gogh (1853-1890). |
Para assegurar que o filho entrasse livremente em Vila Viçosa com os fardos de tabaco ou outras mercadorias, Maria Gertrudes ia, durante a noite, ao frio e ao calor, no verão ou no inverno, conforme combinação prévia, dar-lhe das ameias do Castelo, virada para as terras de Espanha, o sinal de que os guardas tinham regressado a casa.
Quadro "Cabeça de uma camponesa com laço de renda esverdeada" Vincent Van Gogh 1885 |
Cautelosamente, levantava-se a horas avançadas da noite, ia até à muralha agitar a candeia acesa, dando conta ao filho que podia entrar na vila sem qualquer receio, apesar da angustia, tudo fazia para que o filho não fosse notado, consciente do risco de prisão ou mesmo morte a cada transação efetuada, já mais o deixou de o acudir.
Desta feita, nunca foi descoberta a verdadeira razão que levava a velha com a candeia, durante a noite às muralhas do castelo, que apesar do argumento da tesoura não ter produzido efeito, cresceu a ideia de que Maria Gertrudes falava com o Diabo à meia-noite, na muralha do Castelo.
Assim nasce a lenda da bruxa do castelo, representativa certamente de uma realidade existente, o contrabando foi, ao longo de séculos, em toda a geografia fronteiriça, o sustento adicional, para muitas famílias que não conseguiam suprir as suas necessidades no trabalho agrícola.
Desse tempo restam as memórias e os testemunhos, passados entre gerações, muitos sabem se tiveram contrabandistas na família e algumas aventuras passadas das invulgares personagens que mantiveram um permanente equilíbrio entre os que viviam do contrabando e aqueles que faziam valer a legalidade.
Esta história representa a realidade de muitas famílias e ensina-nos que devemos tentar ser justos nos juízos que formulamos sobre os outros. Nem tudo o que parece, nem todo tivemos as mesmas oportunidade nem os mesmo anseios.
Fontes:
Castelo de Vila Viçosa, Direção Geral do Património Cultural, 2011;
Sistema de Informação Para o Património Arquitectónico; Nunes, Castro 1993 e Noé, Paula 2006;
Castelos de Portugal; Roteiro e Lendas; Volume 6, Parafita, Alexandre, 2018;
A Bruxa do Castelo de Vila Viçosa; Livraria Escolar de Vila Viçosa; David, Celestino, 1984;
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