terça-feira, 19 de março de 2019

O Palácio do Farrobo como nunca o viu...

Vista da Quinta e Palácio do Farrobo, Vila Franca de Xira
Foto disponibilizada por Samuel Assis, 2015,Autor e data não identificados.

O que resta do Palácio do Conde do Farrobo é hoje propriedade da Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca de Xira, situa-se junto a um caminho municipal (Estrada da Carapinha), a Oeste da cidade de Vila Franca de Xira classificado como imóvel de interesse municipal desde 2001, encontra-se em avançado estado de ruína. 


Quinta do Conde Farrobo, Vila Franca de Xira
Bilhete Postal s/n da Editora G&F, data n/i.

Na origem da constituição da Quinta do Farrobo onde o palácio está inserido, estiveram várias pequenas propriedades que foram sido adquiridas por aquele que foi o seu primeiro proprietário, Joaquim Pedro Quintela, 1.º Barão de Quintela. Na intenção de acautelar o património da sua descendência e evitar a divisão das propriedades que reunira, instituiu o morgadio de Quintela, o qual foi aprovado por decreto de 18 de Junho de 1791 e constituído por escritura de 23 de Junho de 1801. 
A quando da sua morte, a sua fortuna era avaliada em mais de onze mil contos de réis, um valor astronómico, provavelmente um dos homens mais ricos do país na sua época. 

Joaquim Pedro Quintela (1748-1817)


Retrato de Joaquim Pedro Quintela,1.º Barão de Quintela
Escola Portuguesa, Século XIX.

Joaquim Pedro Quintela (1748-1817), foi um grande comerciante e capitalista lisboeta. A sua ascensão tivera início a quando da morte de seus pais e principalmente tios maternos Luís Rebelo Quintela e Inácio Pedro Quintela, com ligações ao Marquês de Pombal, quando por volta de 1782 recebe uma herança considerável de bens e negócios de grande rentabilidade. 
Partindo do património recebido, Joaquim Pedro Quintela funda uma das maiores casas do seu tempo à qual foi sempre acrescentando contratos reais, tais como os dos tabacos, dos diamantes, do azeite de peixe e baleia e das fábricas de lanifícios da Covilhã e Fundão.
Casou com Maria Joaquina Xavier de Saldanha em 1801, deste casamento nascem dois filhos, Maria Gertrudes Quintela e Joaquim Pedro de Quintela, 2.º Barão de Quintela e depois 1.º conde de Farrobo. Teve ainda uma outra filha fora do casamento D. Joaquina Rosa, que posteriormente legitimou.
Em agosto de 1805 a Rainha D. Maria I concede-lhe o título de 1.º Barão de Quintela.



O Palácio do Farrobo


Ruína do Palácio do Farrobo, 2013.


Todavia o Palácio do Farrobo é mandado construir em 1835 pelo seu filho barão, homónimo Joaquim Pedro Quintela (1801-1869), 1.º Conde de Farrobo e 2.º Barão de Quintela.

Ruína do Palácio do Farrobo, s/d.

Na sequência da vida social anormalmente intensa, a quinta funcionava como uma espécie de retiro de lazer, nas suas terras era produzido vinho, se organizavam caçadas e festas grandiosas e para as quais era convidada a alta burguesia e a nobreza lisboeta.

Ruínas do Palácio do Farrobo, 1996.

Não existem provas evidentes da autoria do protejo arquitetónico do palácio, em todo caso Fortunato Loli é apontado como tal , as semelhanças arquitetónicas com o Palácio das Laranjeiras em Lisboa é evidente, o arquiteto foi também responsável pela construção do Teatro Tália, ambos mandados construir pelo Conde de Farrobo, para alem destes o arquiteto teve a cargo também a construção do Teatro Nacional Dona Maria II.

Ruínas do Palácio do Farrobo, 2013.

Na sequência da vida social anormalmente intensa, a quinta funcionava como uma espécie de retiro de lazer, nas suas terras era produzido vinho, se organizavam caçadas e festas grandiosas e para as quais era convidada a alta burguesia e a nobreza lisboeta.

Ruínas do Palácio do Farrobo, 2013.

O Palácio do Farrobo de planta rectangular, onde se destacam os volumes dos corpos laterais e central avançados em relação aos restantes. o Alcado saliente central é ladeado por duas pequenas torres que se adiantam em altura, em relação ao restante edifício. O edifício em forma de "E" de grande proporção, possui dois andares, sendo o segundo andar nobre, acessado por escadaria exterior com lanços convergentes paralelos à fachada. Toda a fachada é revestida a azulejo esbranquiçado decorados com azulejos azuis simulando o emolduramento das fachadas.

Retábulo da capela, 2013.

No alçado posterior é ainda visível o corpo do antiga capela que nos eu interior possui ainda alguns elementos que permitem relacionar a riqueza arquitetónica e artística de que era revestido o local. 

Pequeno Teatro do Palácio da Brejoeira, 2013.

Possuía no seu interior um pequeno teatro, hoje praticamente imperceptível, um pouco à semelhança do que existe também no Palácio da Brejoeira, não existem muitos exemplares em portugal que aludam a esta pequena extravagancia. Joaquim Pedro Quintela cresceu nos bastidores do teatro de São Carlos, envolvido pelo meio artístico, desenvolve uma especial aptidão crítica de arte, em especial a musica no seu género lírico. A ligação do teatro de São Carlos já vinha de seu pai, um dos financiadores do projeto.

Ruína do Palácio do Farrobo, 2013.

Uma das paredes da sala de jantar foi decorada com uma cena de vindimas, pintada por António Manuel da Fonseca, um dos artistas que o conde protegeu e mandou estudar em Itália, foi mecenas de muitos artistas, nomeadamente pintores, investindo na sua formação.

Ruína do pombal do Palácio do Farrobo, 2013.

A par da vida social, cultural e mundana, o Conde do Farrobo continuou a administração dos negócios da família nomeadamente o contrato real do tabaco, todavia as condições contratuais concessionadas são alteradas e o negócio que ate então era altamente rentável passou a gerar elevados prejuízos, nessa sequência ficou altamente endividado, altura pela qual a propriedade de Lisboa, Palácio das Laranjeiras é vendido.


Ruína do Palácio do Farrobo, 2013.

Em relação à Quinta do Farrobo, logo após a morte de Joaquim Pedro Quintela, em 1869, este foi vendida em hasta pública, também na sequência do golpe financeiro sofrido e, desde a segunda metade do século XX, é visível a degradação que se foi acentuando até à atualidade. Nos anos 70 foi doado à Caritas quando ainda estava em relativo bom estado de conservação mas, de acordo com alguns testemunhos, o palácio foi abandonado após o 25 de Abril de 1974 tendo, a partir de então, o palácio foi desmantelado e saqueado e vandalizado olhos de todos sem que ninguém o impedisse. 

Ruína do Palácio do Farrobo, 2013.

No Verão de 2009, o arquitecto vilafranquense David Carvalho fez do estudo da recuperação da Quinta o objecto da sua tese de mestrado, propondo a sua transformação num Lar da Terceira Idade, mas o projecto não teve continuidade, provavelmente devido ao elevado custo de recuperação.


Joaquim Pedro Quintela (1801-1869) 


Joaquim Pedro Quintela,
2.º Barão de Quintela e 1.º Conde de Farrobo

Joaquim Pedro Quintela, 2.º Barão de Quintela e 1.º Conde de Farrobo
Outros títulos: Par do reino, 2.º senhor da vila de Préstimo, 2.º alcaide da vila da Sortelha; grã-cruz da Ordem de N. Sr.ª da Conceição, comendador da de Cristo, inspector-geral dos Teatros e Espectáculos Públicos, coronel de cavalaria nacional de Lisboa, abastado proprietário e opulento capitalista.

Nasceu em Lisboa no Palácio de Quintela a 11 de dezembro de 1801 e foi no mesmo palácio que viria a falecer a 24 de setembro de 1869.

Filho do 1.º Barão de Quintela, desde muito novo se lhe revelou grande paixão pela música, de tal forma que organizou em sua própria casa uma orquestra e banda, formada pelos seus numerosos criados, tendo contratado um mestre para lhes ensinar a tocar nos instrumentos que preferissem ou para que tivessem mais vocação.

Casou a 19 de maio de 1819, contando dezoito anos com D. Mariana Carlota Lodi, dama da Ordem de Santa Isabel,o jovem barão de Quintela acabava de perder seu pai, que faleceu em outubro de 1817, tendo sua mãe já falecido em 1805, senhor de uma grande fortuna e numa situação familiar vulnerável uma vez que a desigualdade social para com a sua pretendida não era do agrado da família, nomeadamente da irmã, a ponto de o sogro ter sido intimidado para também reprovar o relacionamento, pela firmeza e convicção do Conde o casamento acabaria por se realizar. Nesse mesmo ano o titulo de barão é lhe renovado.

A sua grande paixão pelo teatro português leva-o a construir em 1820 na sua Quinta das Laranjeiras, um magnifico teatro, Teatro Tália, onde se realizaram funções principescas, que se tornaram célebres. A par do que melhor se passava nas casas de espetáculos pela Europa, eram promovidas também outras obras de autores portugueses,que por reconhecido talento, como mecenas impulsionava os nossos artistas.

Liberal por convicção politica, foi um grande financiador da causa contra a monarquia absoluta proclamada em 1828. Já em 1831 na sequência da recusa de contribuir para um empréstimo forçado que o governo do infante D. Miguel decretou, foi exautorado de todas as honras e privilégios, refugiou-se junto dos ingleses chegando mesmo a colocar os seus bens em nome do seu amigo Inglês, lord William Russell, para os acautelar da voracidade miguelina.

Depois deste episódio, acabaria por financiar mais uma vez as tropas liberais de D. Pedro IV e contribuía ativamente para o sucesso conseguido para a recuperação do trono. Em agradecimento de tão relevantes serviços, D. Pedro escreveu do seu próprio punho uma carta ao barão de Quintela, em 18 de fevereiro de 1833. O título do conde de Farrobo foi-lhe concedido por decreto de 4 de abril de 1833, por carta régia de 1 de setembro de 1834 foi eleito par do reino, de que prestou juramento e tomou posse em sessão da respectiva câmara.

Espírito culto e iniciador, promoveu o desenvolvimento da indústria de uma forma excepional, com desinteressada interferência, sem precedentes em portugal. Não foi menos notável cultor e protector das Belas Artes. Verdadeiro artista de coração, os artistas tinham nele um apreciador distinto e um protector afectuoso e dedicado.

Por decreto de 3 de outubro de 1848 foi o conde de Farrobo nomeado inspector geral dos teatros e director do Conservatório Real de Lisboa, quando este estabelecimento estava em muita decadência. O seu nome também ficou vinculado à história do teatro de S. Carlos, de que se fez empresário no segundo semestre de 1838, marcando uma época memorável. 

A fortuna do opulento argentário, que desde muito se ia aluindo, sofreu nos últimos anos da sua vida um profundíssimo golpe com a perda duma demanda, que durante muitos anos sustentou com o capitalista Manuel Joaquim Pimenta. O conde de Farrobo tinha recebido do governo o monopólio do tabaco, concedido como recompensa dos serviços prestados à causa constitucional, e passou-o pouco depois ao referido capitalista Pimenta, mas a lei relativa ao papel-moeda e promulgada pela mesma época em que se concluiu este contrato, alterou-o em prejuízo do comprador, que por isso tentou uma acção judicial contra o conde, que só no fim talvez de trinta anos de lutas se decidiu, ficando o conde condenado, tendo de pagar somas avaliadas em quantia muito superior a 1.000 contos de réis. Esta sentença foi a ruína completa do homem prestigioso que tanto se sacrificara em beneficio do país e pela causa liberal, que talvez não pudesse vingar se não fosse a sua poderosa e valiosíssima cooperação. Este e ainda outros desgostos particulares o levaram a desistir do título de conde de Farrobo, assinando-se ultimamente como barão de Quintela, título que herdara de seu pai.

Falecendo em 22 de julho de 1867 na quinta das Laranjeiras a condessa D. Mariana Lodi, passou a segundas núpcias com M.elle Maria Madalena Pignault. De ambos os matrimónios houve geração.


Fontes:
Património de Castanheira do Ribatejo e Vila Franca de Xira, Volume 6, A colecção Vila Franca de Xira - Saber Mais Sobre..., Orlando Raimundo, 2011;
Direção Geral do Património Cultural, Maria Ramalho, 2016;
Sistema de Informação para o Património Arquitetónico, Paula Noé 1991 / Teresa Vale e Carlos Gomes 1995 / Inês Pais 2005;
geni.com;

Fotos:
delcampe.net;
ruinarte.blogspot.com;
facebook;

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