quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Minas de Carvão de S. Pedro da Cova, meio século depois do fim…

Foto editada da Torre-Cavalete, 
Monumento de Interesse Nacional desde 2010 
Perde-se, pois, nos tempos históricos a fundação medieval da hoje Vila de S. Pedro da Cova. De cariz profundamente agrícola, ela torna-se um centro industrial de grande importância após a descoberta, do carvão e antracite em 1795, mas só nas primeiras décadas de 1900 é que a exploração das minas atingiria o o pico, com uma extração de cerca de 330 mil toneladas por ano.

Foto das escadas do Cavalete da mina de carvão 
O carvão era transportado para o Porto, mais concretamente para o Monte Aventino (zona das Antas), em pequenos vagões, suspensos por um cabo aéreo, com nove quilómetros de extensão. No regresso, as vagonetes paravam na estação de Rio Tinto para carregar a madeira que servia para escorar as paredes subterrâneas.
Foto de algumas das ruínas relativas aos armazéns de e estaleiro de carga. 
Tornou-se então um centro catalizador de migração. Várias gerações de trabalhadores fizeram desta terra o seu ganha-pão, contribuindo assim para um ascenso demográfico assinalável. Isolada que estava, apesar da proximidade do Porto, viu rasgarem-se novos horizontes e o nome de S. Pedro da Cova, começa então a ser conhecido em Portugal como “Terra Mineira”.
Foto de Eletrico igual ao que percorrias as linhas entre o Porto e s. Pedro da Cova. 
Como consequência surge a primeira ligação de transportes ao Porto, com a construção da linha do elétrico, proporcionando um contacto mais regular com uma nova realidade, consubstanciada na grande cidade. 
Nos tempos áureos, as minas davam trabalho a gente do Douro Litoral, Minho e até do Alentejo. Chegaram a empregar mais de 1800 pessoas, entre homens, mulheres, rapazes e raparigas. De um dia para o outro, acabou tudo. 
A baixa dos preços do petróleo traz a crise e as Minas fecham a 25 de março de 1970.
Foto da entrada na Torre-Cavalete 
Quase 50 anos depois, S. Pedro da Cova é um dormitório da Área Metropolitana do Porto, freguesia praticamente estagnada, com poucas aspirações e muitos dependentes do Rendimento Social de Inserção. O espírito de união e a identidade dos que ali viviam (“quase toda a gente tinha alcunhas”) foi-se diluindo. São cada vez menos os que carregam memórias do tempo das minas.
Foto de pormenor da extremidade da Torre -Cavalete de S. Vicente. 
Paradoxalmente, as populações, que julgariam perdidas todas as esperanças de vida, integram-se perfeitamente num mundo laboral novo, completamente diferente do seu. Fica para trás o atraso secular então reinante e novas perspectivas se abrem com melhores condições.

Com a evolução dos tempos vai surgindo um novo tipo de operariado e de serviços. S. Pedro da Cova deixa de ser fechada para se abrir ao mundo exterior e, passo a passo, dilui-se na grande área Metropolitana do Porto, passando a ser um autêntico dormitório da cidade.
Simultaneamente, novas indústrias como a Ourivesaria, a Metalomecânica, Mobiliário, Maleira, Elétrica, Comércio e até Serviços vão aparecendo.

Foto da ruína da fábrica. 

Passou praticamente meio século, desde o fecho oficial das minas e começam a escassear as memórias que possam transmitir o seu testemunho vivo em primeira pessoa, daquele que terá sido o acontecimento com maior impacto económico, financeiro e social, na região, mas com repercussões geográficas bastante mais alargadas a nível nacional.
O encerramento das minas trouxe consigo um silencio entristecedor e uma já não boa melancolia que por sí só também não consegue encubrir o desalento e o derrotado espírito das pessoas que já não se fazia sentir há mais de 100 anos, a falta do som de máquinas a trabalhar, do carvão a encher as vagonetes, a sirene a chamar operários, os veículos rodoviários e ferroviários que percorrias as ruas da vila, assim como os transportes de tração animal, os cestos cheios de carvão que desfilavam pelos cabos suspensos nas linhas até ao Porto, tudo isto fazia parte de um passado recente, cuja feridas ainda cicatrizam.
Foto exemplar de uma Vagoteta também designadas “Berlinas”. 

Para alem das memórias, dos que morreram suterrados, os muitos mineiros deparam-se agora com as maleitas consequenciais de muitos anos em contato com produtos nocivos, diagnósticos de sequelas irreversíveis nos pulmões. Foram esses que sentiram na carne o trabalho sacrificado, a dificuldade em empurrar as vagonetes, chamadas berlinas, totalmente cheias, chegando cada uma aos 700kgs, ou seja a equivalência a 7 “pirus” designação dos carros que transportavam o carvão.

Foto de um gasómetro, Objeto em visas de extinção. 
Os mineiros com um gasómetro desciam até às profundas minas autenticas galerias hiantes e escuras,por uma espécie de elevador ou gávea onde trabalhavam expostos ao excessivo calor e humidade, sem ar respirável e ainda sujeitos à poeira do carvão causadora da silicose, doença profissional crónica, por inalação de sílica.
Quanto às mulheres, também altamente sacrificadas trabalhavam afincadamente no empurrar das berlinas e na função de escolhideiras do carvão, separando o de mais brilho que era o melhor. Havia também as britadeiras que de joelhos em frente dos tanques de lama executavam bolas.
Foto de Edifício habitacional das minas em ruínas. 
Em sinal de apoio a estes trabalhadores foi construído um Bairro Mineiro do qual faziam parte as Casa de Malta, com 2 pequenos quartos e uma cozinha,uma mercearia, escola, farmácia, um campo de futebol e uma espécie de salão recreativo. Aí viviam os mineiros com suas mulheres e filhos que a partir dos 14 anos eram obrigados a ir trabalhar para a mina, pois se houvesse recusa a habitação era-lhes tirada. E ainda hoje, duas das mais ativas instituições da freguesia, a banda de música e o clube de futebol, foram uma criação desse sistema no qual a empresa mandava em tudo.
Foto de um chapéu objeto do fardamento de um mineiro. 
Era assim a vida miserável das “toupeiras humanas”,nome que teve origem no livro de Emile Zola o “Germinal” que tão bem e minuciosamente descreve este clã, ou não tivesse o próprio autor vivido numa mina para aquilatar esta desumanidade de vida.

Capelinha de Santa Barbara, 
Padroeira dos Mineiros. 
Valha-nos Santa Barbara, mesmo em dias de trovoadas ou de poucas explusões, a imagem da padroeira, retirada do fundo da mina quando a exploração cessou, foi entretanto recuperada, a imagem foi transportada para o exterior pelos últimos mineiros a deixar o subsolo. Hoje, a mesma imagem encontra-se numa pequena capela junto do antigo complexo mineiro. Desde há alguns anos para cá, a 4 de Dezembro, retomou-se a tradição da procissão, realiza-se a Procissão de Velas em Honra de Santa Bárbara, Padroeira dos Mineiros.
Foto (editada) da Igreja Matriz de S. Pedro da Cova 

Quando desce de Gondomar até S. Pedro da Cova, com alguma facilidade, por entre a paisagem das suas encostas, arvoredo e a bela torre sineira, consegue também desfrutar das belas ruínas que emergem pelo meio da vegetação, como quem quer apelar pela memória de sua existência.
Foto da ruína da capela da mina.

A Torre-Cavalete ergue-se por traz da capela, quase em ruína, à espera que alguém a recupere e o transforme num museu vivo, com possibilidade de descer à mina e experimentar a sensação de “trabalhar enterrado”, como os mineiros diziam.
 
Foto da Torre-Cavalete de S. Vicente 
Esta Torre-Cavalete do Poço de S. Vicente é, não obstante o seu estado de degradação, o Ex-Libris de São Pedro da Cova, classificado como MIP – Monumento de Interesse Publico, com proteção legal pela Portaria n.º 221/2010, DR. 2.ª Série, n.º 55, de 19-03-2010.

Foto da Torre-Cavalete de S. Vicente 
A Torre -Cavalete é um dos elementos edificados mais relevantes para a conservação da memória histórica das minas de carvão, simboliza o período áureo da exploração das Minas de Carvão a que está definitivamente ligada a história da Freguesia de São Pedro da Cova que desde a descoberta, em 1802, das Minas de Antracite se tornou num centro catalisador de migração.

Foto da Torre-Cavalete de S. Vicente 
É um notável exemplo de construção industrial, pelas suas dimensões, 38,5 m de altura, por ser construído em betão armado o que é raro no seu tempo e também pela sua localização.

O departamento de minas da Faculdade de Engenharia do Porto esteve de uma forma muito especial ligada a esta obra, utilizando frequentemente as instalações para estudos específicos. Para homenagear esta obra o departamento de minas da Faculdade de Engenharia, escolheu o desenho do Cavalete para “logotipo” do seu papel timbrado.

Foto do Museu Mineiro de São Pedro da Cova , antiga Casa da Malta. 
Um dos outros edifícios destinados à perpetuação das memórias da mina é a Casa da Malta, assim designada por nela habitarem os trabalhadores oriundos de outras regiões do país, com o fecho das minas, surge a intenção de cristalizar a memória produtiva em um museu, 1.ª ‘Casa da Malta’, constituindo, na verdade, em 1989 o único núcleo museológico deste tipo em Portugal, também esta classificado como MIP – Monumento de Interesse Publico, pela mesmo portaria, pela designação inclusiva “Cavalete de extracção de carvão e instalações do poço de São Vicente da Mina de São Pedro da Cova, incluindo a casa da Malta”. 

o Museu Mineiro de São Pedro da Cova tem como missão valorizar, dinamizar e divulgar o seu património mineiro e geológico.

Foto da Zorra preservada à espera de restauro. 


À porta está parada e à espera de conseguir fundos para ser reabilitada uma zorra, carro eléctrico que transportava carvão para a central termoeléctrica de Massarelos, no Porto, onde hoje é o Museu do Carro Elétrico.

Foto do Museu do Carro Eléctrico , antiga Central Termo-Eléctrica de Massarelos 

Central Termo-Eléctrica de Massarelos. Hoje, parte das instalações são o Museu do Carro Eléctrico, “A Recolha” e presumo que ainda estão guardadas e em perfeito estado muita da maquinaria e fornos utilizados à época.

Foto das ruínas dos armazenes de depósito do carvão para britar. 
Em 2001, mais de 200 mil toneladas da Siderurgia Nacional foram depositadas nas antigas minas daquela localidade de Gondomar, com autorização a Camara Municipal de Gondomar, por serem considerados residuos inertes e sem grandes implicações ambientais.

Um estudo do Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) confirma que os resíduos são de facto muito perigosos.

Foto da plataforma da Torre-Cavalete, para entrada no Poço de S. Vicente.
Entre outubro de 2014 e maio de 2015 foram retiradas 105.600 toneladas, mas entretanto foi revelado que existem mais resíduos, tendo sido anunciado no local, a 24 de março do ano passado pelo ministro do Ambiente, que o concurso público com vista à remoção total das 125 mil toneladas que restam seria lançado em julho e a empreitada levada a cabo em 2018.

Foto da parte superior de depósitos de carvão. 

Foto da parte inferior de depósitos de carvão,  onde saia carvão para britar e carregar as berlinas.
 
A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte revelou que o concurso público internacional para a segunda fase da remoção dos resíduos acolheu sete propostas.

O Ministério do Ambiente anunciou a alocação de 10 milhões de euros do Fundo Ambiental para a remoção definitiva de 125 mil toneladas de resíduos perigosos. Entre outubro de 2014 e maio de 2015 já tinha sido feita uma parte da limpeza mas ficou bastante aquém da solução definitiva que se pretendia para o problema.
Foto da estrutura envolvente á Torre-Cavalete de S. Vicente. 
Segundo garantiu o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, foi lançado um concurso público para apar até o final de 2018, os resíduos estarem totalmente removidos de S. Pedro da Cova.

Segundo o Presidente da União de Freguesias de Fânzeres e S. Pedro da Cova, Daniel Vieira, Neto de Mineiros, para além do processo de remoção havia um compromisso do governo relativamente à questão da monitorização ambiental e que existe uma garantia de que a contaminação das estruturas circundantes não chegou a acontecer, apesar de o risco ser real.
Foto de ruínas de um edifício habitacional,  e grande plano da Torre-Cavalete de S. Vicente. 
Também segundo o Presidente da União de freguesias, para além do plano ambiental, há um objectivo claro de requalificar esta zona no plano cultural por constituir um exemplar único da história industrial mineira, não haverá melhor compensação do que a requalificação desse património e respetiva devolução à população, para que também ali pudesse ser criado um pólo atrativo turístico e cultural para preservação da memória.
Foto do cais de carga, grande plano do armazém de depósito  e do carvão e da Torre-cavalete 
Na realidade, quem vai espreitar o que outrora foram as minas, leva um enorme choque pois tudo não passa de uma carcaça, um rico património da arqueologia industrial destruído, à boa maneira portuguesa.

Ainda é possivel um Museu, recuperando o que ainda há, melhorando o espaço, construindo pavilhões para exposições temporárias e permanentes,sala multimédia, auditório, percurso histórico com guias ligando as minas à Casa da Malta ( actual Museu)e aos bairos mineiros, criação de um Centro de Documentação e Investigação, sala de convívio,estabelecer protocolo com as Escolas de forma a inserir alunos e professores no projecto, etc, de forma a ligar de novo o espaço à comunidade e até ser uma fonte de receita.

Foto das ruínas dos balneários. 

Fotos das ruínas de um edifício habitacional 

Em ruínas e ao abandono, o balneário, a farmácia, os escritórios, a cantina, a portaria, são apenas algumas das peças de um passado escrito com o carvão descoberto em 1795.

Foto das ruínas da portaria das minas. 
Quanto ao Museu Mineiro, instalado na antiga Casa da Malta onde os mineiros vindos do Douro Litoral, do Minho e até do Alentejo eram acolhidos, reúne ferramentas, a maqueta de uma galeria subterrânea, cadastros de ex-trabalhadores, entre outros espólios, e faz, sobretudo a comitivas de escolas, visitas guiadas.
Foto das ruínas do armazém de depósito de carvão. 
Fontes:
cinemateca.pt/
olhares.sapo.pt/
porto24.pt/
joelcleto.no.sapo.pt/
doportoenaoso.blogspot.pt/
cris-sheandbobbymcgee.blogspot.pt/
restosdecoleccao.blogspot.pt/
monumentosdesaparecidos.blogspot.pt/
roteirodeminas.pt/
portojofotos.blogspot.com/
fanzeres-saopedrodacova.pt/
jpn.up.pt/
lugaresesquecidos.com/
expresso.pt/
visao.sapo.pt/
ocastendo.blogs.sapo.pt/
portoarc.blogspot.com/
pt.wikipedia.org/
rtp.pt/
jn.pt/local/noticias/porto/gondomar/

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