quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Sanatório de Mont’Alto ou Sanatório de Valongo

Fachada do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018

Uma Necessidade;

Cartaz: B.C.G. Mais Vale Prevenir do que Remediar 
Coleção da Tuberculose – 1955, In http://www.insa.min-saude.pt

A propagação da tuberculose teve um exponencial crescimento nas duas ultimas décadas do século XIX, o elevado nível de contagio e o desconhecimento das precauções para com a epidemia, estiveram na origem da sua dimensão.

Cartaz: Assitencia Nacional aos Tuberculosos
Coleção da Tuberculose – 1930
Também Portugal viria a ser atingido com o surto e assim como a maioria dos países desenvolvidos ou, tecnicamente, em vias de desenvolvimento, teve que adotar medidas que podassem dar resposta não só aos casos diagnosticados, mas também salvaguardar os sãos. A capacidade hospitalar para os receber, com o acrescido risco de contagio e a necessidade de isolamento, ficavam muito aquém do necessário.

Foto de funcionárias do Sanatório Mont’Alto numa sala de tratamentos.
Já no inicio do século XX começam a surgir sanatórios por todo o país, de norte a sul, do inteiro ao litoral. O aparecimento destas unidades hospitalares está diretamente relacionado com a doença, desde a escolha da sua localização geográfica até a sua especialização médica.
Ilustração Alusiva a Homenagem à Rainha Dona Amélia 
pelo reconhecimento das suas acções beneméritas. 
A Rainha Dona Amélia, esposa do Rei Don Carlos e ultima a ocupar esse cargo antes do asilo entre França e Inglaterra, fundou a 11 de junho de 1899 o Instituto Nacional de Assistência aos Tuberculoso, que esteve na origem da construção dos sanatórios em todo o país.

 
A ATNP (Assistência aos Tuberculosos do Norte de Portugal ) , hoje é uma IPSS que tem como objetivos o apoio a crianças, jovens e famílias, na saúde, educação, cultura,  desporto e intervenção comunitária. In Facebook da ATNP 

Outras instituições surgem com o intuito do combate à doença, em 1930, com a fundação da Assistência aos Tuberculosos do Norte de Portugal (ATNP) pelo professor António Elísio Lopes Rodrigues, a região ganha novo fôlego no combate ao flagelo. É então que o Sanatório de Mont’Alto, conhecido como Sanatório de Valongo, mas localizado em São Pedro da Cova, concelho de Gondomar, começa a ganhar vida, ultimo a ser construído no país, as obras arrastaram-se anos e anos e o Sanatório, que começou a ser construído em 1932, só foi inaugurado em 1958, entre financiamentos bloqueados e petições populares.

Fachada do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto,
Ruína em 2018 
O local escolhido, Monte de Santa Justa, um dos três pontos de maior elevação das “Serras de Valongo”, a pouco mais de 6 km da cidade do Porto e repartidas entre os concelhos de Valongo, Gondomar e Paredes, foi escolhido pela proximidade dos grandes centros e ao mesmo tempo pelo isolamento geográfico e ainda porque a altitude de 367 metros proporciona um ar de qualidade superior, fator importantíssimo para o tratamento da doença sobretudo relacionada com os pulmões.

A Memória e Obra de um Arquiteto:


Júlio José de Brito (1896-1965), Arquiteto, Engenheiro e Professor.
In sigarra.up.pt 
A obra de Júlio de Brito contribuiu para a construção da imagem da cidade do Porto na primeira metade do século XX, no entanto a sua obra extensa e distinta tem hoje maior visibilidade do que seu próprio nome. Filho do pintor homónimo Júlio de Brito, seguiu os passos do pai enveredando pelo mundo das artes, estudou também na Escola de Belas Artes do Porto, onde se formou em arquitetura e onde acabou por lesionar durante vários anos, mais tarde inscreveu-se também na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto onde se viria a formar em engenharia civil.
Foto do Teatro Municipal Rovoli, Projeto de arquitetura e engenharia da responsabilidade  de Júlio Brito, propriedade da Câmara Municipal do Porto, situa-se na Praça D. João I e foi inaugurado em 1913 como teatro e em 1932 reinaugurado com as adaptações como cinema. In Wikipédia.pt e editada.

Paralelamente ao ensino, desenvolveu importantes projetos de engenharia e arquitetuta, projectou grandes e pequenas construções, umas mais notáveis, outras dentro dos gostos encomendados. Seguidor do mestre José Marques da Silva, um dos principais responsáveis pela introdução da era modernista na cidade do Porto, Brito soube desenvolver e, nalguns momentos, evoluir em paralelo.
Foto do Coliseu do Porto, Projeto arquitetónico estilo “Arte Deco” resultado da pareceria  dos arquitetos Júlio Brito, Cassiano Branco e Mário Abreu, propriedade da “Companhia de  Seguros Garantia”, situa-se na Rua Passos Manuel e inaugurado em 19 de dezembro de 1941.
Foto de Paulo Pimenta in Jornal Público e editada. 
Parte da sua obra fica para a História como o Teatro Municipal Rivoli e o Coliseu do Porto, mas também a Faculdade de Engenharia e os Edifícios Garantia (da Rua de Sá da Bandeira, da Avenida dos Aliados e de Famalicão), cujos formulários serviram de paradigma às gerações de arquitectos que se seguiram. 

Foto de funcionárias do Sanatório Mont’Alto, é possível observar o aspeto da fachada principal
do edifício ainda em funcionamento. In http://portugalparanormal.com, s/d 
Júlio de Brito esteve perfeitamente integrado na “Escola do Porto”, movimento caracterizado por um modernismo arquitetónico estabelecendo ligações entre a arqutetura clássica e o “Arte Deco”, potenciadas pelas tecnologias e necessidades atuais. No entanto nunca abandonou de fato a arquitetura tão apreciada pelo regime do Estado Novo, a “Casa Portuguesa” com caraterísticas ancestrais e intrínsecas da cultura portuguesa.
Júlio José de Brito foi um artista do seu tempo, lembrado pela Câmara Municipal, que, por deliberação de 7 de Julho de 1992, atribuiu o seu nome a uma rua da freguesia da Foz do Douro Rua de Júlio de Brito.
Foto de visitantes e familiares de doentes internados no Sanatório Mont’Alto, é possível observar o aspeto da entrada principal do edifício, localizada na lateral  e ainda a escola no lado direito. In http://portugalparanormal.com, s/d 

Uma das suas primeiras grandes obras viria a ser o imponente Sanatório de Mont’Alto, Inaugurado em 1958, o enorme edifício está inserido numa área de 88.000 metros quadrados, aproximadamente nove campos de futebol,possuía 5 pisos e um recuado, camas para internamento com capacidade de 500 pacientes, para além da imensidão do Sanatório, a área envolvente contava ainda com uma escola, uma lavandaria, uma igreja com acesso interior direto, uma capela e um reservatório de água, todos eles estão hoje devolutos e em avançado estado de degradação.
Vista Aérea do Complexo dos Edifícios que Integram o Sanatório de Mont’Alto.
Foto in avalache-lazer.blogspot.com, num artigo relacionado com o desporto PAINTBALL. 

Fachada rpincipal da pequena escola do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 

Fachada lateral da igreja em primeiro plano, parte da lavandaria em segundo plano e o reservatório de agua ao fundo em terceiro plano, Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 

Como já referido anteriormente a ideia da construção do Sanatório no inicio dos anos 30, aparece ligada a fundação da ATNP, o problema é que para alem da demora da sua conclusão, cerca de 26 anos, chega numa altura em que a doença começa a ser tratada em deambulatório, desde 1958 a 1972 podemos dizer que para a dimensão e capacidade do edifício, foi um período de funcionamento muito curto, face ao investimento projetado.

Fachada lateral do edifício e porta principal do Sanatório de Mont’Alto, 
ao fundo o que resta da pequena escola. Ruína em 2018 

A partir dos anos 70, os sanatórios perdem a sua importância com o aparecimento de tratamentos mais eficientes sem necessidade de internamento e por isso tornam-se obsoletos, sendo relegados para o esquecimento: Em 1972, já havia muito poucas pessoas no Sanatório e a grande maioria funcionários do Couto das Minas de Carvão de S. Pedro da Cova, alí muito próximo e também extinto nos anos 70, fruto da descida do preço do petróleo que passou a configurar uma opção mais rentável para a industria.

Atualmente o Sanatório de Mont’Alto;

Fachada do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 
Um complexo hospitalar cujo pico de atividade terá rondado os 300 pacientes no inicio dos anos 60, atualmente, relativamente às funções para que fora projetado, já só restam memórias, não se encontram vestígios óbvios de que, um dia, aquele lugar tenha sido um hospital de fato.

Pormenor das janelas da área de serviço do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018.

Vista de cima das pequenas escadas de serviço do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 

5.º Patamar, vista parcial da sala principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 

Corredor de acesso aos quartos do Sanatório de Mont’Alto,
Ruína em 2018 

Sem uma única porta, uma janela, apenas salas amplas completamente vazias, corredores descaracterizados, casas de banho completamente vandalizadas, ausência de corrimão e caixas de elevadores vazias são traços em comum nos seis pisos que compõem o edifício.

Pormenor da paredes do ultimo andar do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 
Terraço da varanda e fachada exterior do piso recuado de Mont’Alto, Ruína em 2018 

As paredes, principalmente a do ultimo andar, são dos poucos elementos que apresentam alguma vida, cobertas de grafites que embora não combinem com o lugar, conferem alguma beleza artística que talvez um dia tenha tido.
Perspetiva do ultimo andar do Sanatório de Mont’Alto, sobre Gondomar e parte do Porto
Ruína em 2018 

Vista do ultimo andar do Sanatório de Mont’Alto, sobre Gondomar e parte do Porto
Ruína em 2018 
Vista do ultimo andar do Sanatório de Mont’Alto, sobre as serras de Valongo
Ruína em 2018 
O ultimo piso, um recuado já sem teto e com uma ampla varanda a todo o cumprimento do edifico, é talvez a maior atratividade ou a melhor recompensa para quem explora o local, a vista fabulosa que proporciona, num dia completamente limpo, prolonga-se até ao mar.
Capela do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018
Interior da Capela do Sanatório de Mont’Alto, sobre as serras de Valongo, Ruína em 2018
Igreja do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018
Interior da Igreja do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018
Também da igreja e da capela não há vestígio de qualquer aspeto artístico original, as paredes destas encontram-se também decoradas ao gosto casual de quem por lá passa e deixa testemunhada a sua arte.

Fachada do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018
 
Não foi apenas o tempo o grande responsável pelo estado de degradação dos edifícios, depois que a instituição deixou de trabalhar com doentes de tuberculose, e com o estrito relacionamento que mantinha com o Estado Novo, depois do golpe militar, os seus edifícios foram saqueados, extinguiram-se os mecenas e o sanatório de Mont’Alto foi-se degradando.

Grande plano da fachada do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 

Após o saque de que foi alvo, ainda é possível encontra objetos pertencentes ao sanatório por várias casas da região, desde camas, cadeiras, de entre outros utensílios. O Sanatório foi também fustigado por incêndios como é possível constatar pelo seu estado débil assim como pelas árvores queimadas nas imediações do espaço.

Pormenor das cosinhas e casas das máquinas do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto,
Ruína em 2018 
Das atividades que caracterizavam o lugar há mais de 50 anos, não há vestígios, muito embora saibamos que a medicina, a religião e o ensino tenham sido atividades de grande relevância para os utentes.
Ângulo da Fachada do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018
Hoje o potencial do lugar é explorado por um leque de atividades mais diversificados, a criatividade é o limite de quem visita o lugar.
Foto da organização de um simulacro no edifício do Sanatório de Mont’Alto,
Ruína s/d 

Foto do Exercício de simulação de situação sísmica na capela do Sanatório de Mont’Alto,
Ruína 2015, In verdadeiroolhar.pt Talvez das mais importantes e com maior interesse para a população em geral, estão os testes e simulacros promovidos pelos Bombeiros e Proteção Civil, apesar de estes provocarem alguns danos acrescidos ao já degradado edifício.

Reflexo do Interior da Igreja do Sanatório de Mont’Alto, 
Ruína em 2018 

Outra das atividades óbvia e com maior intensidade, até pela dimensão e versatilidade do espaço são os grafites, não equaciono a legalidade nem tenciono, o fato é que edifícios abandonados, pelo menos os que visitei, são lugares bastante apetecíveis para a realização desta atividade que nem sempre está relacionadas com a arte, mas não no meu ponto de vista.
Programa da organização de uma atividade radical  no Sanatório Mont’Alto, Ruína, 2018 

Parede do corredor de um dos pisos, fustigada com as balas do paintball, Ruina 2018
 
Ainda dentro das utilizações mais comuns, está o paintball, quem já explorou o lugar e conhece os recantos do complexo consegue perceber o interesse que existe associado para a prática deste desporto, estruturas labirinticas cheias de corredores, aberturas de portas e janelas, edifícios de várias altitudes e o próprio isolamento, são características do agrado dos amantes da modalidade. Várias as empresas “vendedores de experiências” desportivas, promoverem eventos no local. São visíveis nas paredes as pintas coloridas dos disparos falhados do decorrer da “caçada”
Foto de noiva as ruínas do sanatório de Valongo, s/d, In fotofigueiredo.com 

O edifício acolhe ainda, casualmente, fotógrafos de várias áreas de atividade, desde eventos familiares, fotógrafos de moda, fotografia artística entre outras que encontrem potencial nos cenários proporcionados pelo local.
Foto de registos alegadamente sobnaturais. Ruínas, s/d In http://portugalparanormal.com


Foto de um dos corredores do edifício principal do Sanatório 
de Mont’Alto, Ruína em 2018 

É também muito conhecido pelo “darck tourism” é mesmo um dos mais conhecidos do país, talvez pela sua atividade associada a morte, tenha popularizado como um local ligado ao mundo sobnatural, certo é que das duas vezes que o visitei reparei em algumas situações evidentes de “atividades” decorrentes ligadas ao oculto mais conhecidas como rituais. Encontram-se com alguma facilidade reportagem filmadas no local sobre o tema, no youtube, por exemplo.
Foto das janelas de um salão do edifício principal do Sanatório 
de Mont’Alto, Ruína em 2018 

Também percebi que no piso térreo, pelo menos, até há bem pouco tempo, o espaço serviu de abrigo para pessoas sem condições financeiras, os vestígios eram bastante recentes.
Foto do ultimo patamar das escadas principais, onde é visível a reconstrução com tijolos da 

vedação do patamar, edifício principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018
Toda via é visível alguma manutenção no espaço, claramente é efetuada a remoção de resíduos e também se tenta asseguara a limitação de acesso a locais que possam oferecer maior perigo, como por exemplo o acesso as escadas e poços de elevadores.

Especulação sobre o Sanatório de Mont’Alto;


Captação Aérea efetuada o complexo do Sanatório de Mont’Alto, s/d In datario.net .
Em cada abordagem que é feita a história do sanatório, são varias as especulações que se atribuem ao futuro do lugar.
Foto das janelas de um salão do edifício principal do Sanatório 
de Mont’Alto, Ruína em 2018 
A ATNP, instituição responsável pela gestão do local, tem uma ambição definida para o complexo, é imperativo promover a sua reabilitação, entendem que o potencial do lugar deverá ser canalizado para a saúde ou o turismo, de uma forma integrada com os cerca de 9 hectares de terreno. Turismo porque beneficiaria toda aquela zona de Gondomar e saúde para ser usado pela comunidade. O Sanatório cresceu com o apoio da população para ajudar as pessoas mais debilitadas e enquanto IPSS, os objetivos de vertente social são prioritários.
Capela do Sanatório de Mont’Alto, vista do terraço, Ruína em 2018 
O equacionamento de projetos ambiciosos para o local, pela dimensão do investimento e pelo interesse publico local, passa por parcerias, nomeadamente com a Câmara Municipal de Gondomar.

Fachada lateral do edifício e porta principal do Sanatório de Mont’Alto, ao fundo o que resta da 
pequena escola. Ruína em 2018
A verdade é que o Sanatório de Mont’Alto continua ao abandono há quase 50 anos e, apesar de terem surgido ideias de alguns projetos na comunicação social local, como um hospital para os retornados do Ultramar ou um hospital psiquiátrico, um lar de idosos também foi uma possibilidade, mas a verdade é que nada avançou e ainda hoje se especula sobre a reabilitação do edifício principal, espero que encontrem uma solução, com maior antecipação face ao eventual estado irreversível de ruína, do que foi a sua inauguração em função dos tratamentos efetivos para a época.
4.º Patamar da escadaria principal do Sanatório de Mont’Alto, Ruína em 2018 

Fontes:
portugalparanormal.com/
monumentosdesaparecidos.blogspot.com/
jpn.up.pt/
flickr.com/
Júlio José de Brito, arquitecto e engenheiro civil– um artista no Porto – Manuel de Sampayo Pimentel Azevedo GRAÇA
Foto das janelas de um salão do edifício principal do Sanatório de Mont’Alto, 
vista sobre o Porto, Ruína em 2018 

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