domingo, 23 de junho de 2019

Capela de São Tomás de Aquino, Caparica

Capela de São Tomás de Aquino, 1982.
Fotografia do espólio do Centro de Arqueologia de Almada

Almada é uma cidade e cede de concelho, pertencente ao distrito de Setúbal e esta situada na margem esquerda de estuário do Tejo. A cidade desenvolve-se numa área plana orientada para o estuário, entre a Ponte 25 de Abril e a Trafaria, zona orientada para a foz do Tejo, desenvolvem-se grandes escarpas, zona essencialmente rural e agrícola. Almda é anterior à formação do país, o topónimo deriva de Almadam que significa "mina de ouro ou de prata" referencia à exploração destes metais na encosta do Tejo. Foi conquistada aos mouros a 1147 e recebeu fural de D. Afonso Henriques em 1170, por D. Sancho I em 1190 e mais tarde por D. Manuel em 1513.

Brasão Municipal de Almada.Gravura da obra As Cidades e Villas da Monarquia Portugueza que Teem Brasão d'Armas (III vols., 1860-62; data na capa do vol. I, 1865), de Inácio de Vilhena Barbosa (1811-1890).

Durante séculos a povoação  foi procurada pelos  nobres lisboetas para nela instalar as suas quintas e palácios de veraneio, com interesse nas suas águas sadias, ares lavados e vistas desafogadas. Foi local muito apreciado para esses fins pela Rainha D. Leonor Teles, D. Pedro V,  D. Nuno Álvares Pereira e Gil Vicente que lá escreveu o Auto da Índia em 1509. Hoje, as zonas rurais do concelho de Almada, mantêm as suas quintas com os edifícios e terrenos de cultivo, no entanto outras encontram-se abandonadas e em degradação, abrindo portas para a descaracterização provocada pelos avanços da construção civil. 

Ruína da Capela de São Tomás de Aquino, Fachada principal, 1980.
Fotografia reproduzida e editada do SIPA.

De entre as mais importantes, destaca-se a Quinta da Torre, cujo nome tem origem numa extinta torre medieval existente no local, possivelmente mandada erguer ou pelos Templários de Cristo ou pela Ordem de Santiago. A Quinta da Torre foi das mais importantes do Reguengo da Caparica, quer pela produção agrícola, que pela proximidade das "Fontes Santas" e pelas relações dos seus proprietários com a família real e nobreza da corte. Esta quinta foi instituída sede de morgadio a 22 de novembro de 1569 por D. Tomás de Noronha, do Conselho de Estado do Rei D. Sebastião, e sua mulher D. Helena da Silva. A 24 de janeiro de 1570, por alvará de D. Sebastião, a instituição do morgadio é autorizada.

Ruína da Capela de São Tomás de Aquino, Pormenor do frontal do altar, 1980.
Fotografia reproduzida e editada do SIPA.

A sede do morgadio da Caparica na Quinta da Torre dispunha de casa de habitação, lagar, celeiro e uma pequena ermida dedicada ao orago de São Tomás de Aquino que se localiza num ponto isolado da quinta. Estes templos, embora estivessem inseridos no espaço das quintas, eram construídos numa zona afastada da casa principal, num local remoto da propriedade, que se apresentava como lugar perfeito para o culto e oração.

Ruína da Capela de São Tomás de Aquino, Pormenor de óculo e cúpula derrocada, 1980.
Fotografia reproduzida e editada do SIPA.

A Capela de São Tomás de Aquino e o poço rectangular, com duas colunas em pedra, existente na mesma quinta, são os únicos monumentos com características arquitectónicas manuelinas em todo o concelho de Almada. A capela foi manda edificar no século XVI,  por D. Tomás de Noronha no pomar da quinta, supostamente sob as ruínas dum morabito árabe. A sua construção é  contemporânea da fundação da Paróquia da Caparica. De arquitectura religiosa, a capela desenvolve-se em planimetria rectangular composta originalmente por uma única nave e capela-mor. No interior, a nave era coberta originalmente por duas abobadas artosoadas que terão caído durante o terramoto de 1755. Subsistem as mísulas de descarga, que apresentam vestígios de pintura, e as pedras de fecho das abóbadas, encontradas durante escavações realizadas no local em 1979.

Ruína da Capela de São Tomás de Aquino, Pormenor dos capitéis do portal, 1980.
Fotografia reproduzida e editada do SIPA.

A fachada principal, fachada contrafortada rasgada por portal ao gosto manuelino ladeado por quatro colunelos que sustentam um arco duplo carena ou contracurvado, formado por duas curvas côncavas em baixo que se prolongam para o vértice do arco em duas curvas convexas, cujo vértice aponta para um óculo que se encontra encimando o portal.

Ruína da Capela de São Tomás de Aquino, Pormenor de mísula no arranque da abóbada, 1980.
Fotografia reproduzida da Junta de Freguesia da Caparica e Trafaria.

A Capela de São Tomás de Aquino mostra, à semelhança de muitos templos edificados ao longo das primeiras décadas do século XVI, uma simbiose entre as estruturas trado-góticas a introdução da decorações ao gosto manuelino, criando um espaço que, embora seja ecléctico, se apresenta bastante harmonioso.

Ruína da Capela de São Tomás de Aquino, Arco da capela-mor, 1980.
Fotografia reproduzida e editada do SIPA.

Entre o corpo principal e a capela-mor, existe um arco de volta perfeita. A capela apresenta uma cobertura por abóbada polinervada e alberga, junto à parede fundeira, o altar revestido por azulejos enxaquetados, agrupados a formar uma malha geométrica em xadrez utilizando alternadamente a cor verde e branca, numa tipologia utilizada em portugal entre a segunda metade do século XVI e meados do século XVII.

Ruína da Capela de São Tomás de Aquino, Pormenor do arco da capela-mor, c.1980.
Fotografia reproduzida do site Geocaching Portugal.

Apesar das sua pequenas dimensão, aqui se realizaram, sobretudo durante  XVIII, baptizados e casamentos entre as famílias dos Condes dos Arcos e dos Condes de S. Miguel, durante estas cerimónias era comum a presença de importantes pessoas ligadas à corte de D. João V. Contudo, o terramoto de 1755 destruiu a capela que apesar de se ter mantido na posse da família dos Condes dos Arcos até finais do século XIX, não foram realizadas obras de recuperação.

Vista Geral da Capela de São Tomás de Aquino, 1987.
Fotografia reproduzida e editada do SIPA.

Em meados do século XX, eram proprietários da capela  o Sr. José Manuel de Menezes Alarcão e o Sr. Nuno José de Menezes Alarcão, no inicio dos anos 80 a capela encontrava-se completamente ao abandono e cheia de entulho, a Câmara Municipal de Almada, sensibilizada para o estado do monumento e no sentido de preservar a memória histórica do mesmo, demonstrou vontade em o adquiri.

Vista Geral da Capela de São Tomás de Aquino, 1987.
Fotografia reproduzida e editada do SIPA.

Depois de constatar o abandono a Câmara Municipal contou com a ajuda do Centro de Arqueologia de Almada para efectuarem, por sua conta e risco, algumas obras de recuperação e preservação do templo. Algumas das obras foram executadas com carácter provisório como por exemplo a chapa de alumínio que serve de cobertura, devido à falta de verbas, não avançaram com obras de carácter mais definitivo.

Vista lateral da Capela de São Tomás de Aquino, 2012.
Fotografia reproduzida do grupo AMO-TE ALMADA.

Por iniciativa da Câmara Municipal de Almada, em 1982 foi elaborado um dossier para candidatura de classificação da capela a monumento, que havia de ser aceite edecisão publicada por decreto a 6 de março de 1996. Todavia, esta classificação em nada viria a mudar o futuro da capela, actualmente o monumento de interesse público, encontra-se esquecido por entre a vegetação que se tem apoderado das suas fachadas.  Por não terem sido efectuadas obras de conclusão para a reabilitação do edifico, o mesmo não foi referenciado para efeitos turísticos permanecendo assim desprotegido e condenando ao abandono permanente.
Armas de D. Sancho de Noronha, 1º Conde de Odemira, 1390,
Armas de Noronha chefe, in Livro do Armeiro-Mor, 1509.

D. Tomás de Noronha nasceu em Alenquer, sendo filho de D. Pedro de Noronha, fidalgo escudeiro do Rei D. Sebastião, e de D. Maria Jordôa. Casou com sua prima D. Helena de Salazar, filha herdeira de Pedro Salazar de Penha, mestre de campo e governador da Torre de S. Julião, e de D. Benedita Jordôa. Tendo enviuvado passou a segundas núpcias em 27 de abril de 1621 com D. Catarina da Veiga, filha de Henrique Esteves da Veiga. Faleceu em Alenquer, em 1651. Jacinto Cordeiro, no Elogio dos poetas lusitanos, publicado em 1631, o coloca entre os mais célebres poetas do seu tempo. Das suas obras poéticas se poderiam formar muitos volumes, mas somente se publicaram alguns Romances e Décimas jocosas, no tomo V da Fenix Renascida, Lisboa, 1728.

Fontes:
"Ruralidade em Almada e Seixal nos Séculos XVIII e XIX - Imagem, Paisagem e Memória", Francisco Manuel Valadares e Silva, UAL, 2008;
"Capela de São Tomás de Aquino", Sistema de Informação para o Património Arquitectónico, Texto de Isabel Mendonça,Paula Noé, 1992, 2011;

Sem comentários:

Enviar um comentário