quinta-feira, 6 de junho de 2019

Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete

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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 2006
Fotografia de JMMS, in olhares.sapo.pt

A Ermida de Santo António da Ussa encontra-se inserida na Herdade da Barroca d'Alva, localizada a nascente, numa imensa zona verde (de protecção aos montados de sobreiro) pertencente à freguesia de Alcochete e contornada a poente pela Estrada Nacional n.º 118. Erguida por volta do século XVI, com uma arquitectura invulgar no país, característica do período tardo-renascentista erudito, a construção da ermida terá resultado do reaproveitamento de uma construção pré-existente.
A designação de "Ussa", era uma palavra mediava para designar "urso", poderá ter origem em algum milagre ocorrido no local, devendo-se a construção da capela ao cumprimento de um voto de agradecimento.

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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 2017
Foto do Grupo de Forcados Amadores do Aposento do Barrete Verde de Alcochete

Inserida num  extenso e frondoso montado, a Ermida encontra-se sobranceira a um lago com cerca de 1,5 quilómetros de diâmetro, durante a época chuvosa,  o nível da quota da água sobre formado-se uma ilha no meio do lago, rodeada por um vasto arvoredo. Num idílico ambiente absolutamente deslumbrantes, destacam-se ainda os cavalos e toiros em liberdade que compõem a paisagem centenária.

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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 2016
Foto reproduzida de agulhamagnetica.pt

A Ermida encontra-se isolada, protegida por uma fortaleza composta por dupla cintura de muralhas ameadas, sendo o acesso feito por escadaria em pedra. Todavia, a estrutura amuralhada de defesa não está explicada, assinalando talvez uma primitiva atalaia ou um reduto romano ou godo aproveitado pelos árabes. O corpo da capela apresenta planta circular apenas rasgado pelo pórtico com frontão semicircular, e com cobertura em cúpula esférica, enquadra-se na tipologia das cubas alentejanas. O interior do templo apresenta paredes cegas, e no lado oposto ao pórtico são visíveis os vestígios de um altar.

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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 2013
Foto de Mário Gomes, in flickr.com

Existe um conjunto de monumentos religiosos nos concelhos de Alcochete e Montijo, edificadas em meados do século XVI, que evidenciam características estéticas pautadas por um padrão semelhante, ao estilo tardo-renascentista erudito, que tem os seus mais directos antecedentes nas soluções italianizantes que melhor singularizam a nossa produção arquitectónica quinhentista. 
Com efeito, a Ermida de Santo António da Ussa, as Misericórdias  de Alcochete e Montijo, a Capela de Nossa Senhora da Vida, em Alcochete, e principalmente a Capela da Nossa Senhora da Vida partilham várias características deste estilo, que de forma directa ou indirecta as relacionam com o mesmo mestre, o enigmático Fernão Fidalgo, um arquitecto pouco conhecido, a quem se tem vindo a atribuir estas construções religiosas, que no caso das Misericórdias, a autoria dos projectos já foi confirmada.

Infelizmente a ermida encontra-se bastante degradada, depois da merecida classificação de Interesse Histórico e Artístico, merecia um restauro e, se o proprietário assim o entendesse, integração nos roteiros turísticos. É uma obra invulgar e merece mais atenção. Ainda assim é de realça que a Herdade da barroca d'Alva promove esporadicamente algumas actividades de lazer em parceria com a Câmara Municipal de Alcochete.

A Herdade da Barroca d’Alva


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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 1992
Bilhete Postal, Edição CMA, in delcampe.net.

Em meados do século XV, o território da Barroca era propriedade da Coroa, pelos seus ares lavados e tranquilos, a região era já um destino de veraneio apreciado por D João I e D. João II para desenvolver actividades equestres, pesca e caça. Também D. Manuel I  fica muito ligado a Alcochete, terra que o vê nascer a 31 de maio de 1469, o mesmo que lhe atribui foral a 7 de janeiro de 1515.

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Brasão de armas da Vila de Alcochete, 1992
Bilhete Postal, Edição CMA, in delcampe.net.

No entanto a constante desmatação da Barroca para abastecer Lisboa de lenha, viria a penalizar as actividades de lazer da realeza, uma vez que os terrenos se estavam a transformar em charneca devido ao abate de árvores, fenómeno que atingia um vasto território. Assim a coroa doa os terrenos ao Cavaleiro da Ordem de Cristo, Álvaro Afonso de Almada, que era seu proprietário já em 1585. 

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Herdade da Barroca d’Alva, Campinos encaminhando o gado, 1992
Bilhete Postal, Edição CMA, in delcampe.net.

Em 1619, o fidalgo D. André Ximenes de Aragão, cavaleiro da Ordem de Cristo, sexto filho de um rico mercador,, institui em testamento com sua mulher D. Maria Ximenes, um morgadio de 10 mil cruzados que tinha como sede a Barroca d'Alva, importância de que era credor ao Duque de Bragança.

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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 2013
Foto do Grupo de Alcochete

A admnistração deste vínculo passou depois a um filho de nome Tomás e, por morte deste, a um seu sobrinho, Jerónimo. Deste passou a outro sobrinho D. Rodrigo Ximenes de Aragão e depois ao seu neto D. Francisco Inácio Ximenes Coutinho de Aragão Barriga e Veiga. O morgadio foi depois herdado por D. Rodrigo Caetano Pereira Coutinho Barriga e Veiga seu filho bastardo. Nesta altura já a maior parte das terras da Barroca tinha revertido para a Coroa.

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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 2018
Foto de Cristina de Sá.

Em 1747 Jácome Ratton, um cidadão francês vem para Portugal e duas décadas depois, conseque o arrendamento vitalício das terras da Barroca d'Alva, iniciando uma plantação de amoreiras e a criação de bichos-da-seda. Procede ao arroteamento dos terrenos incultos, enxuga pântanos, limpa valas, etc.
Nos terrenos existia então apenas uma ermida dedicada a Santo António segundo o próprio Ratton com casa anexa em ruínas, pertença da comenda de São Tiago de Alcochete.

Jácome Ratton teria procedido ao restauro da Ermida mantendo as suas características. Segundo as suas recordações (Jácome Ratton, 1920): "havia mais no valle chamado de Santo António da Ussa, junto a hum pego rodeado de salgueiros, hum pequeno edifício arruinado e isolado em forma de pombal, cousa de 18 palmos de diametro e pouco mais de 20 até 25 de altura, coberto de abobeda e circundado na distância de 10 a 12 palmos de hum muro com ameias à maneira de hum pequeno forte, o que tudo mostrava existir de tempo immemorial. No interior deste edificio se achavaõ signaes de ter ali existido hum altar e ter sido huma ermida dedicada a Santo Antonio, cuja imagem havia tradiçaõ ter sido transferida para outra ermida contígua às casas de que já fallei". 

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Ermida de Santo António de Ussa da Herdade da Barroca d’Alva, Alcochete, 2017
Foto do Grupo Rio Frio, a herdade e os riofrienses.

Em 1810, perseguido por suspeita de colaboração com os apoio as invasões franceses, Ratton exila-se em Inglaterra. Na sua ausência, o filho Diogo Ratton assume a direcção dos negócios. Este é senhor do Prazo da Barroca d'Alva, membro da Comissão de Obras Públicas e membro fundador da Sociedade Promotora da Indústria Nacional, concluindo as obras do primitivo solar da Barroca já desaparecido.

Em 1876, José Maria dos Santos, empresário agricultor com posição a nível europeu, compra a Barroca d'Alva e courelas anexas ao Barão de Alcochete D. Jacques Léon Daupiás, filho de Bernard Daupiás primeiro Barão e primeiro Visconde de Alcochete, casado com D. Emília Júlia Ratton, sua prima e herdeira da Barroca por via paterna.

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Recorte do artigo coma Classificação do PDM, 1997.
Diário da República n.º 193/1997, Série I-B de 1997-08-22, aqui.

Em 1913 morre José Maria dos Santos, passando a direcção dos negócios para seu sobrinho António Santos Jorge, pai do actual proprietário eng.º Samuel Lupi Santos Jorge.
A Ermida de Santo António da Ussa, proposta pelo Plano Diretor Municipal (PDM), encontra-se classificada como  monumento de Interesse Histórico e Artístico de âmbito local – Diário da Republica de 22 de Agosto de 1997.
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Fontes:
"Memorias da herdade Rio Frio" Pedro Pereira Leite, 2009;
"Igreja da Misericórdia de Alcochete ", Direção geral do Património Cultural;

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